quinta-feira, 30 de abril de 2009

A queda

Caio a cada passo pois tropeço
nos braços de um vento duro e frio
caio tão bem que já conheço
cada palmo do inferno e até já rio

Cada vez que caio até chamusco
nas labaredas do demo a minha alma
e quando volto a pensar com alguma calma
sinto-me então triste e acabado!

Espero um dia tropeçar
de tal modo que ao cair não toque o chão
e seja o dia em que aprenda a voar

Asas não tenho e até suspeito
apenas me resta o poder sonhar
que o coração não me arranquem deste peito

Carlos Tronco
Mondeville
3/09/05

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Fui falar de ti




Caule, vertical
Crescendo, divertido
Sonho vegetal
De braço estendido

Multidão em floresta
Que respira em verdes folhas
Agua feita chuva, divina, tu que molhas
À árvore das de beber, cais e é sempre festa

Caule feito tronco
Que é mais forte cada dia
E de raízes profundas, da terra, vou ao encontro

Fui terra, barro amassado
A terra hei-de voltar
Talvez sejam saudades, saudades do meu passado

Carlos Tronco
Fui falar de ti as árvores
Mondeville
20/09/05

domingo, 26 de abril de 2009

Acontece



Sentado no colo, deitado no peito
Semeando vento, mais que tempestade
Um peito, um abrigo, fonte de amizade
Encosto feliz, a face, ao meio

Em fonte de carinho, água é a ternura
Procuro encontrar, uma razão à vida
De que cada etapa, é uma despedida
Hoje uma ilusão, ontem lua escura

Amanhã novo dia, volta o sol, sobre o mar
Com o sol, volta a esperança e a vida continua
E a maré é a vida, que recua para avançar

Encosto a minha cara, escuto minha querida
No peito, o coração bate sem parar
No cabelo dedos de mão; a doce mão... Da vida

Carlos Tronco
Lisboa
4/08/05

sábado, 25 de abril de 2009

Seja Abril a cada instante




Se um dia por acaso aqui passaste
ao sentires na aurora o perfume da saudade
lembra-te do cravo vermelho que pisaste
e sabe porque perdeste a liberdade

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Sementeira

Caminho e andando, semeando duvidas
Perguntando a mim mesmo o que é amar
Questões sem resposta, verdades viúvas
Mas vou caminhando, querendo avançar

Conheci outrora, linda rapariga
De olhar tão meigo; escrevia bem
Lembrança que guardo, como uma figa
Passaram os anos e foi-se também

Casei e com filhos, caminho já feito
Julguei nesta vida, ter enfim chegado
Mas o coração, batia no peito

Um quase velhinho, de barbas já brancas
Continuo andando, será que floriu
Cada flor selvagem, que o tempo pariu?

quinta-feira, 23 de abril de 2009

O OLHAR

O Olhar,

vai-se perdendo
no vácuo do distante,
ao longo dos anos
por vezes,
só ás vezes,
se encontra
em outros olhos perdidos,
e sorri

As mãos não acariciam
nem só ventos,
nem só sonhos

por vezes acariciam peitos,
mas também almas.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

SABER





Não sei que esperanças ter
Não sei dizer
Qual rumo é o melhor
Não sei mostrar
Só sei que sigo o fado
A pensar
Talvez seja seguir-te, o meu destino


Não sei há quanto tempo
Sigo a lua
Depois, noite perdida sigo também
O sol, como se fosse a sombra tua
Sem brilho
Pois tu és a luz, meu bem

Só sei, quando em mar alto,
Ando perdido
Que o abraço mortal, das ondas,
Já desejo
Sempre me foi possível fugir do perigo
E encontrar a calma, a vida
No teu beijo.

Carlos Tronco
Mondeville
18/09/05

domingo, 19 de abril de 2009

Noites escuras de tão negras




A distância já é castigo
quisera dormir contigo
sabes bem, não pode ser
passam dias, passam noites
silêncios são como açoites
mas ajudam a viver

Alta noite lembro, querida
esse episódio da vida
em que dei o primeiro beijo
as saudades são ajudas
quando as tristezas mudas
cobrem por todo o desejo

Bem sabes, estou contigo
como em sonho, como um perigo
estou ali a espreitar
feito fumo de uma vela
só te falta acende-la
para me poder amar.

Carlos Tronco
Mondeville
17/09/05

sábado, 18 de abril de 2009

Traição





Traição

Quantas vezes me traíste?
Tantas ou mais que eu?
Há jogos assim.
Em que perdemos os dois.
Perdemos primeiro a liberdade,
Porque nos entregamos.
Perdemos em seguida a dignidade,
Porque nos enganamos.
Perdemos enfim a alma,
Porque nos traímos a nós mesmos.
Traímos os nossos sonhos,
Traímos a nossas promessas,
Traímos os nossos ideais.
Sabes, o mais engraçado,
E poder trair e continuar a amar.
Engraçado porque esse amor é impossível
O hipotético perdão, não passa de uma ilusão.
Uma miragem no deserto de nós.
Trair é o passo último
No suicídio da nossa consciência.
O amor que resta tem o sabor
Amargo do vomito, ou pior
O sabor letal da vingança.
Em realidade, nunca saberei se me traíste,
Ou se preferi pensar que o fizeste.
De qualquer modo, pensar, foi
A minha forma de te trair.
Não houve penitência…
Muito menos purgatório.
Assim aprendi, que o inferno
Nesta vida, se chama solidão.
Longe dos teus versos,
Ainda mais que dos teus olhos,
Apenas te desejo que sejas muito feliz.

Adeus

Carlos Tronco
Mondeville
18/04/09

META


Sabine 8 anos

META
Os anos passam
Sente-se a metamorfose
Velhos desejos voltam
A flor da pele
Sonhos estranhos
Com sabor a doce mel
Ser eu fadista
Não saudosista
Mas sempre fiel

Fiel a um ideal de vida
E com palavras
Ideias, sonhos, partilhar
Palavras simples das que saem da barriga, paridas
Muito nossas como se do próprio filho se tratasse
E tão expressivas como o brilho do olhar

Houve outros, houve muitos
Sonhadores
No oriente, na Grécia antiga
E até Cristo
Mas todos vamos esquecendo com o tempo
Por vezes olhamos suas ideias como um perigo

De morte
Oh medo, que tão grande medo tens
Nosso ultimo destino...
Logo, enquanto a morte não vem
Vivamos os nossos sonhos, com carinho

Carlos Tronco
Mondeville
14/09/05

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Fui




Que te dizer, senão que a distância queima a esperança, como o sol queima a seara?
Vimos o verde trigo ondular em verdes campos e, com o ondular da brisa crescer a vontade.
O trigo faria rodopiar a mó do moinho. A mó faria girar as velas tão brancas e as velas?
As velas acatariam os ventos de outras paragens.
Como sabes, são a loucura dos ventos que transportam o sopro dos meus beijos.
Disseram-nos, que o verde trigo antes de ser cegado, havia de amadurecer.
Então esperamos. E as tempestades foram muitas. E o trigo foi-se dobrando a uma vontade superior.
Esta regia o mau tempo. O trigo não amadureceu. Mas os cabelos foram-se tornando brancos.
Quem disse que os velhos não amavam? Amam. Mesmo em silêncio. Mesmo quando a dor sufoca a voz
E as palavras engolem a garganta. Talvez cada dia perca um pouco mais o juízo.
E já não saiba pedir que a tua mão me proteja de mim.
Continuarei no entanto, como dizia o poeta, a amar-te baixinho, para que o teu Deus não nos castigue.
Ele que inventou a distância, detesta o amor, que cria a proximidade.

Carlos Tronco
Mondeville
17/04/09

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Emociones y vida



Emociones y vida

Quisiera
Quisiera morir ahora mismo
Si quizá un día
Quedase insensible
A la vida
A la danza de las nubes
O a la caricia de los vientos

Quisiera
Quisiera morir ahora mismo
Si quizá un día
Ya no llorase
Cuando tocan las guitarras
Cuando cantan las chicas
Historias simples de amor

Quisiera
Quisiera morir ahora mismo
Si ya no emocionase
El sonreír de una cría
El brillo de las estrellas
O él salgado
Del agua de las mares

Todavía
El destino quiso que no
Continuo llorando
Cuando grita de placer una mujer
Y vuelve de las profundizas de la noche
Un nuevo sol

Que un dios
Me dé fuerza
Para negar hasta la muerte
La sombra de las banderas
Tal como la tranquilidad de los genérales
Para que mi alma vuele
Cada día
En cuanto pueda
Escuchar las golondrinas

Carlos Tronco
Mondeville
10/09/05

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Velas rotas queimam a esperança




Além, após o mar,
Adormecem as ondas
Para que despertem os meus sonhos.

Tu, que esperas, no novo dia,
Enfim a alvorada,
Ofereces a tua nuca à minha loucura.

O oceano rebela-se ;
As ondas fustigam os penedos,
Mas na planície, já o trigo ondula
E a música acorda.

Primeiro é preciso acreditar.
Depois, o amor acontece.

Além, após o mar,
Descem as velas do mastro
Para se erguerem os punhos da esperança.

Como me reconheceras?

Não!

Não levarei comigo a bandeira de uma Pátria
Que não soube alimentar os seus filhos.

Nem crucifixo "genocidário".

O meu cravo vermelho
Esta tatuado no interior do peito
E apenas, nos calos da minha mão estendida
Poderás ler a sina
Do nosso eterno amor.

Carlos Tronco
Caen
15/04/09

Fumos



Os dedos da mão
Unidos
Em um só destino
Um só apertar
De dedos
Espremendo sumos
Expressando medos
Entrelaçados
Como fumos
De duas chaminés perdidas
Que se abraçam
Ao tocar o céu
Livres de voar
De mãos dadas
Enquanto
Céu
Existir

Carlos Tronco
Mondeville
08/09/05

terça-feira, 14 de abril de 2009

Quando funde a neve, perde o branco a cor




Quando funde a neve perde o branco a cor

Chegou a primavera, branco decomposto
Em mil cores exposto, cada uma é
Promessa de vida, esperança de amor
Há que recolher-la seja aonde for

Quando funde a neve perde o branco a cor
Para transformar frieza invernal
Em jardim florido, cheiro a alecrim
Cada rosa tem, seu charme para mim

Perfume suave, desperta os sentidos
Quando funde a neve perde o branco a cor
Basta, o tempo passa, a distância dura
E não acredito, natureza pura

Seja pois bendito, cada tom de novo
Só existe rei, onde haja povo
Cego pela luz, de olhos queimados
Ninguém é feliz, de joelhos magoados

Poesia "naïve"
Mondeville
06/04/05

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Castelos de areia





A areia escorre livre entre os dedos secos
Como o pobre mar, retirando-se sem nobreza
Sabemos que com o tempo volta de certeza
E que, o que a orelha escuta em búzios, são só ecos

Das almas perdidas em alto mar
Ou em terra firme e levadas pelos rios
Almas de seres que depois de frios
Lembramos apenas pelo voo das folhas pelo ar

As crianças brincam na praia fazem castelos
Alheias ao drama da vida e felizes
Quando adultos, recordamos esses tempos belos

Recordamos a areia em que brincávamos
Também os sonhos de quando éramos petizes
E sonhando, transportar para o alto mar nos deixamos...

Carlos Tronco
Praia de Houlgate-Normandia-França
30-08-05

quinta-feira, 9 de abril de 2009

A Liberdade

Em uma capela, ao alto, vendo a foz do Sena
E a água correr, molhada, de tanto labutar
Deitar-se cansada, deitar-se a afogar
O feroz Atlântico, impávido mete medo

Entrei na capela, sombria, onde havia
Velhos traços de fé, também de piedade
Alguém acreditara na "verdade"
Confiando, em um "Ser", que ali vivia

Com algumas moedas, comprei luz
Pensando a minha alma sombria, aclarar
Com a chama pequenina que produz

A vela de cera, que acendi
Com a esperança de um futuro salutar
Ardeu, e com ela algo perdi.

Carlos Tronco
Notre Dame de la Grâce
Honfleur-France

terça-feira, 7 de abril de 2009

AS DUAS FACES DO VENTO

Perdido na vida, pontapés ao vento quero dar
Perdido em sonhos, perdida a alma e o olhar
Será que o vento, então magoado, depois consinta
Em levar consigo, levar bem longe, levar o pranto
Secar as lágrimas, esticar as velas, trazer encanto
Talvez guiar, guiar a mão, com que se pinta

Com letras, depois palavras, fazem-se quadros
Cenas bucólicas, trigos deitados, em verdes prados
A esperança, faz-nos viver, dia após dia
Vamos andando, barriga cheia, até de medos
Medos do mundo, medo de Deus e dos segredos
A madrugada, seja onde for, é sempre fria

Depois...

O sol devagarinho, vai chegando e com ele a vida
Espreguiçando, esticando os braços, conseguida
A força para nova aventura, afrontar
Sorriso nos lábios, cabelo ao vento, alma ligeira
As mãos nos bolsos, língua na boca e por cegueira
Juntar palavras, cumprir a sina, à assobiar.


Carlos Tronco
Mondeville
06/09/05

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Pastor de penedos 3


8, rua da Fonte Tinhela concelho de Valpaços Prortugal...


Depois, o tempo foi passando.
Continuava-se a acumular toneladas de ouro…
Era assim, a vida de pastor…
1954
O granito por companhia e a solidão por companheira.
A missa do domingo, o único espectáculo da semana.
Por vezes, lá vem um ou outro lobo trocar umas palavras.
Ou roubar um cordeiro
é consoante
No primeiro domingo de Setembro
a festa em Valpaços
O fogo-de-artifício como única promessa de felicidade
vinda dos céus
A jeira não dava para comer
Cegadas, só uma vez por ano
Um dia o "Pátria" lá me levou para o Ultramar
em Trás-os-montes
os saltões eram verdes
mesmo assim recusei
o primeiro prato de camarões
na camioneta que me levou para as matas de café
ia também
a esperança
Só regressei à aldeia
a finais de 75.
o céu continuava insípido
depois de 3 dias imigrei para França
até hoje
dia em que duas palavras resumem uma vida inteira.

Ao Fernando Tronco que anda estes dias pelos 80...

domingo, 5 de abril de 2009

Pastor de penedos 2



São quase seis da manhã
Ainda se vê a estrela do pastor
Tenho sete anos
O pai morreu no princípio do inverno
Pneumonia
Dizem que já havia medicamentos
Mas, como poderia
Ter pago o médico
E a farmácia
Sem tirar o pão da boca
Dos meus cinco irmãos mais novos?
O mais velho, o falecido Júlio, que tinha
Dois anos mais do que eu
Ficou com o rebanho
Andava pelo monte
Entre penedos e lobos
A noite inteira
Agora ia-lhe levar, à Cotovia
Uma côdea de centeio
Uma "mão-cheia" de figos
E uma pinga
Enquanto o Júlio dormia
Era eu que cuidava do gado
Já não ia à escola
Se fosse, chegaria atrasado
Assim, tirei apenas a terceira classe
Depois...
O Senhor Padre Cura bem queria
Que fosse para Alcobaça
Dizia que não teria
Qualquer dificuldade mais tarde
Para entrar no seminário
Mas,
Com o Júlio atrás das ovelhas
E a mãe com cinco crianças ao colo
Quem iria sachar as batatas
Amanhar a vinha
E cegar o pão?
A noitinha,
Depois de tocar as vacas do lameiro,
Passarei pela capela
Do Senhor dos Aflitos.
Pedirei apenas que arranje algum fardo
Para levar até Feces de Abajo
Dizem que a Guardia Civil
Atira sem prevenir
No entanto,
Sempre será melhor
Morrer no contrabando
Que morrer de fome.

Tinhela
Concelho de Valpaços
1936.

sábado, 4 de abril de 2009

Pastor de penedos 1


Foto de Georges Dussaud in "Tras-os-montes"


O gado já não saia ao monte há três dias.
Ovelhas e cães rafeiros juntavam-se em um só ganido.
Era o reino da fome.
A febre tinha aumentado e
o chá de ervas da tia Adília, apenas tinha molhado a garganta e feito permanecer a esperança.
Tossindo e espirrando, naquela manhã de domingo apenas eu tinha ficado à lareira. Missas haveria outras...
O escano de castanho como trono da miséria.
Ardia um madeiro de carvalho.
Na semi-penumbra da casa de lavradores, economisava-se o azeite da candeia.
Com o calor da lareira, a dura madeira do escano, luzidia de tanto uso, tornava-se confortável.
Do alto pendiam, alheiras, salpicões, linguiças buchos e presuntos tal como pendia outrora da macieira o fruto do pecado.
Tinha sim engolido à pressa um cibo de broa, três figos da Terra Quente, e um trago de bagaço.
O olor do fumeiro turturava-me as entranhas.
Tinha dito a mãe que ali não se tocava, o salpicão de Valpaços era já conhecido em todo o país.
Havia de comprar as batatas para a sementeira, duas sacas de trigo, enxofre para as vinhas…
-Será que os haviam contado?
…na alegria das matanças, enchia-se a tripa até mais não dar
naquele tempo, pouco se ia a escola
talvez nem soubesse contar…
…é que, quando vinha carta de Macau do tio Alberto, pedia sempre para eu ler
devagarzinho, soletrando cada palavra,
palavras de um longe desconhecido, só conhecidas de quem fugia a terra.
-Talvez nem tivesse contado !
…vencido pela febre, o desejo quase carnal, peguei na vara mais comprida ali à mão e levei à lareira.
A ponta rubra da vara era então brilhante como a estrela cintilante de uma varinha de condão :
pela primeira vez da minha vida, senti na minha mão o poder do fogo, um igual de Hephaistos!
Era tempo de assar à pressa.
...é que o senhor padre não se atardava com sermões de aldeia...

Carlos Tronco
Caen inverno 07

quinta-feira, 2 de abril de 2009

A ver...

A ver vamos...

Não olhes nos meus olhos
que te cegas
não olhes pois veras
o meu olhar
não vejas nos meus olhos
quanto negas
quando aceitas
dos meus braços
o baixar